Ribeirão Preto, um caso emblemático de violação do direito à moradia
- sasparqbr
- Sep 17, 2016
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Com o crescimento da produção imobiliária nos últimos anos, o valor dos terrenos, das construções e dos aluguéis subiram muito em Ribeirão Preto.
Em algumas regiões da cidade, lotes urbanizados subiram mais de dez vezes e os aluguéis mais de três, enquanto que os salários nos principais setores econômicos mantiveram-se acompanhando, quando muito, a inflação anual. As consequências desse processo é o aumento do número de pessoas e
famílias que não conseguem arcar com os custos de uma moradia digna e acabam recorrendo a alternativas mais econômicas como a co-habitação - dividindo casas de parentes e amigos - ou a habitação em áreas irregulares e precárias - como nas favelas e ocupações de luta por moradia.
Ocorre que a lógica da produção urbana de Ribeirão Preto é mais perversa do que parece ser. A disputa pelas melhores localizações para os empreendimentos privados é constante e leva milhares de pessoas à permanente insegurança quanto à posse de um terreno, seja público ou privado, e quanto à esperança de se conseguir uma casa via programas públicos.
Esses empreendimentos, quando decidem investir em determinada região, pressionam o mercado imobiliário local e o poder público a valorizarem essas áreas, estancando a aplicação de políticas de habitação de interesse social e engendrando despejos forçados nas favelas e ocupações próximas
às áreas de seu interesse.
O maior exemplo dessa prática acontece na zona norte de Ribeirão Preto, com o projeto de expansão para a internacionalização do Aeroporto Leite Lopes. Nessa perspectiva, diversas construtoras e investidores passaram a se interessar pela região, antes abandonada de políticas públicas e que
contém o maior número de favelas e ocupações na cidade.
Ao anunciar o projeto de expansão do Aeroporto, pelo Governo Alkmin, a Prefeitura municipal e os proprietários do seu entorno partiram para um
plano de despejos forçados e reintegrações de moradias regulares abaixo do preço do mercado. O foco de um plano como este é chegar à lucratividade máxima com o mínimo de investimentos.
Atualmente, existem já mais de 40 pedidos de reintegração de posse (despejo) das 62 ocupações e favelas de Ribeirão Preto. Caso executadas, serão despejadas mais de 10.000 pessoas nessas situações, jogadas às sarjetas da cidade com violência, sem atendimento social e sem ter para
onde ir.
Práticas como essa revelam os preconceitos de parte de uma elite provinciana e patrimonialista contra a população pobre da cidade e devem ser denunciadas. Já no século 21, não podemos mais aceitar que pessoas sejam tratadas como menos importância que terrenos e patrimônios. Desde 1948, com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a humanidade não aceita mais que o interesse econômico se sobreponha ao direito à vida. Em 1965, o direito à moradia passou a constar no pacto dos direitos
econômicos sociais e culturais. Nesse caso, defender a vida vai além de garantir a integridade física das pessoas, inclui também garantir condições dignas de se viver, o que faz da moradia um direito fundamental.

Para enfrentar as dificuldades vividas pelas ocupações e favelas ameaçadas de despejos, o povo decidiu se unir. Com a ajuda da União de Movimentos de Moradia de São Paulo (UMMSP) e Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo (SASP), movimentos e ocupações de luta por moradia da cidade,
ONGs, assessorias técnicas e jurídicas e população em geral formaram a Frente de Defesa da Moradia Digna e Direito à Cidade, Frente esta que realizará, nos dias 26 e 27 de setembro, uma denúncia pública de violação do direito à moradia digna.
Essa denúncia vai abrir as portas de seis comunidades ameaçadas de despejo para os organizadores da Frente, que averiguarão as condições de moradia e de vida nesses lugares e as apresentarão em relatório a ser entregue aos órgãos de defesa dos direitos humanos, com cópia para as autoridades competentes. Além disso, as atividades da Denúncia também contam com a realização de uma Plenária Municipal de Movimentos de Luta por Moradia e Direito à Cidade (dia 27, às 13hs) e com uma chamada de imprensa. Como observadora, Ribeirão Preto terá a responsabilidade de receber a arquiteta e urbanista Raquel Rolnik, professora da FAU-USP, que foi relatora especial para o direito à moradia adequada da ONU.
Maurílio Chiaretti
Presidente do SASP
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