Vigor na construção civil?Para quem?Por Maurilio Chiaretti
- Maurilio Ribeiro Chiaretti
- May 25, 2015
- 2 min read
Lendo a matéria que traz informações do Sinduscon, um sindicato patronal, fica parecendo que o setor não está em crise, que não está demitindo e que segue forte e vigoroso mesmo diante de um clima tenso nas contas nacionais e para os setores produtivos, mas um clima tranquilo para os financeiros. É preciso, no entanto, observar ao menos duas contradições nas impressões que o texto passa.
Em primeiro lugar, é preciso apontar que a construção civil é um setor altamente terceirizado. No processo em que passou nas últimas décadas, a grande indústria da construção diminuiu muito, tornando-se, via de regra, uma grande contratante de serviços. A empreitada, por exemplo, se dividiu totalmente, dando origem a equipes especializadas em fundações, estruturas, alvenaria, instalações e acabamentos.
Na arquitetura e no planejamento, esse modelo já é antigo, porém intensificou-se para dentro dos escritórios e órgãos públicos. Em ambos os casos, a terceirização, apoiada pela flexibilização das leis trabalhistas, já ocupa a maior parcela dos cargos que seriam de carreira. Nota-se, portanto, que os dados do Sinduscon dizem respeito somente a uma parcela menor de trabalhadores, números estes correspondentes aos contratos no regime CLT. O resto fica fora de aumentos e benefícios oriundos de acordos coletivos de trabalho, pois estes não existem para terceirizados.
Dizer que arquiteto ganha R$ 7.000,00 neste setor é uma piada para quem conhece por dentro a sua realidade. Em média, os salários destes profissionais terceirizados não chegam a 50% desse valor. E na atual conjuntura, ao invés de "aumento salarial" (aumento este irreal, pois não cobre a inflação), estão enfrentando demissões, formalmente praticadas como quebra de contratos de serviços, sem quaisquer direitos ou garantias. Como se trata de contratos irregulares de trabalho, os mesmos não passam por homologação nos sindicatos de trabalhadores, o que dificulta muito o levantamento de dados destes profissionais.
Em segundo lugar, não bastando a burla de leis trabalhistas, os 6% reajustados em 2015 soam como migalhas diante da alta da construção civil nos últimos anos. Aumentou o valor da terra, o custo da construção e da comercialização. Não aumentou, no entanto, o salário dos arquitetos. Reflexo disso é notável na qualidade da produção do ambiente construído neste período de alta, tanto das obras públicas quanto das privadas. Com os arquitetos participando somente nas etapas operacionais do projeto, ficando a concepção e o desenvolvimento de técnicas e sistemas construtivos subjugados aos interesses políticos e econômicos de seus contratantes, fica nítida a falta de arquitetura e de urbanismo na grande parte da construção brasileira.
Por fim, ainda cabe uma reflexão: uma vez que todo o processo produtivo da construção estiver terceirizado, inclusive legalmente, não seria mais coerente, na lógica do mercado, os arquitetos e urbanistas passarem a receber uma porcentagem do valor do seu produto no mercado, tal como corretores, ao invés de salário? Se o consenso for afirmativo, devemos agora parar de acreditar em falsos testemunhos.
Maurilio Ribeiro Chiaretti é presidente do SASP (Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo)

Comments